Nelson
Mattos: realidade virtual mexe com a emoção
Doutor em Ciências da Computação, gaúcho, residente
no Silicon Valley, Califórnia
Por: Nelson Mattos
21/02/2016 - 05h01min | Atualizada em 21/02/2016 - 05h01min
Durante anos, filmes de ficção
científica criaram civilizações futuras com naves intergalácticas e robôs mais
inteligentes que nós. Embora (até agora) a maioria das previsões não tenha se
concretizado, uma tem se tornado cada vez mais real: a simulação da vida real
por computadores — em termos técnicos, realidade virtual e aumentada. Como nos
filmes, somos transportados virtualmente para outros ambientes para termos
determinada experiência ou vermos o que acontece. Desenvolvimentos tecnológicos
mais recentes têm trazido até nós várias das surpreendentes realidades virtuais
e aumentadas dos filmes de ficção científica.
Mas o que são exatamente
realidade virtual e aumentada?
A realidade virtual (RV) cria um
ambiente que simula a presença física no mundo real ou imaginário, permitindo
que o usuário não só nele interaja, mas tenha, por meio da visão, tato, audição
e olfato, a "sensação" de estar lá. O ambiente simulado pode ser similar
ao mundo real, proporcionando experiências como em simulações de treinamento de
pilotos ou missões de combate, ou ser bem diferente da realidade, como nos
jogos de RV, bastante populares entre os jovens.
A realidade aumentada (RA)
combina elementos da RV com a vida real. Os usuários podem interagir com o
conteúdo virtual no mundo real, sempre percebendo, porém, a diferença entre os
dois. Um bom exemplo de RA é o Google Street View: você "passeia"
virtualmente por ruas e locais do mundo, interagindo com o conteúdo virtual
(imagens do mundo real), sem ter, porém, a "sensação" de estar lá.
Na RA, você "mergulha"
no conteúdo virtual composto por imagens do mundo real. Já na RV, é o ambiente
simulado que "cresce" à sua volta, provocando sensações em você.
São várias as aplicações de RA já
no mercado. Na arquitetura, é usada para criar modelos 3D para se ver o prédio
e caminhar virtualmente por seu interior. É amplamente utilizada por militares
para enviar em tempo real dados aos óculos de RV dos soldados para auxiliar na
navegação e avisá-los de perigos. Uma das minhas aplicações favoritas de RA é a
visualização prévia do uso de um produto no smartphone. Quem nunca viu algo e
pensou... "será que ficaria bem"? Instale o aplicativo de RA
"Coral Visualizer" das tintas Coral no seu celular e veja as paredes
de sua casa pintadas de outra cor. Com a tecnologia RA do ModiFace Mirror, você
vê seu rosto na tela do celular, escolhe cosméticos e batons, e
"aplica" no seu rosto até encontrar os que mais combinam com sua pele.
Vídeo ilustrativo: modiface.com/mirror. A mesma tecnologia é usada para mostrar
o efeito de Botox, tratamentos de pele ou cortes de cabelo.
Até então com pouca expressão
comercial, a RV evoluiu rápida e significativamente em 2015. Grandes marcas,
estúdios de cinema, empresas de jogos e novas organizações fizeram avanços
incríveis na criação de conteúdo usando a tecnologia. Recentemente, o "The
New York Times" enviou mais de um milhão de Google Cardboards (óculos RV
de papelão que, conectados ao smartphone Android ou, dependendo do aplicativo,
ao iPhone, possibilitam experiências RV) a todos assinantes para promover seu
novo aplicativo — NYT VR. Nele você pode "andar" pelas cenas de
filmes e documentários, virando para lá e para cá, da mesma forma que "anda"
pelas ruas no Street View. Veja alguns vídeos em
nytimes.com/newsgraphics/2015/nytvr/. Para intensificar a experiência, use um
Google Cardboard (menos de US$ 20) e fones de ouvido. Não tem óculos de RV? Sem
problemas, role o vídeo com o mouse, como faz no Street View.
Em 2015, big players como Google,
Microsoft, Facebook e Apple também lançaram ótimas aplicações, buscando a
liderança no mercado de RA e RV. Foram várias aquisições, e os investimentos em
realidade virtual e aumentada atingiram um recorde de US$ 700 milhões, sendo
US$ 250 milhões só no Q4 2015.
Acredito que 2015 foi o primeiro
ano no qual essas tecnologias foram realmente aceitas pelo usuário, e 2016 será
o ano em que começarão a alcançar o grande público.
Com o YouTube suportando agora vídeos
em 360°, e o Cardboard suportando YouTube e Street View, você não precisa mais
do mouse para "olhar" para a direita ou esquerda. É só virar a
cabeça. A Google já tem 5 milhões de usuários de Cardboard no mundo com mais de
25 milhões de aplicativos instalados, mais de 350 mil horas de vídeos de RV
foram vistos no YouTube e mais de 750 mil fotografias já foram tiradas com
Cardboard. No Facebook, usuários também já podem acessar vídeos em 360° e ter
experiências RV.
E como são criados vídeos em
360°? Como na criação do Google Street View, são necessárias câmeras especiais
sincronizadas para criar vídeos em 360°. Em 2015, vários fabricantes lançaram
câmeras 360°, desde a pequena Ricoh Theta S (US$ 349) até a Nokia Ozo para
profissionais (US$ 60.000). Oculus, Samsung, Sony e HTC têm agora versões
sofisticadas de óculos de RV que são, basicamente, Google Cardboards
turbinados, mais confortáveis e com hardware especializado em captação de
movimentos.
Com vídeos em 360°, a RV dominou
o uso da tecnologia em 2015 e continua em plena expansão.
Fomentar a educação por meio da
RV é foco do projeto Google Expeditions (veja google.com/edu/expeditions).
Professores escolhem um destino e, usando Cardboards, levam seus alunos em
excursões virtuais à Veneza ou à Grande Muralha da China. Mais de 500 mil
estudantes já participaram do projeto. Já imaginou as mudanças positivas que
essa tecnologia trará não só à educação, mas também ao turismo?
Na verdade, veremos grandes
mudanças em todas as formas de experiência visual. Em breve, você colocará
óculos de RV e assistirá a um jogo como se estivesse no melhor local do
estádio. Loucura? Não é. Em outubro passado, quem tinha um Samsung Gear VR pôde
assistir, em tempo real, a um jogo de basquete entre dois grandes times
americanos "sentado" em uma cadeira de US$ 600 no estádio de Oakland,
Califórnia, sem pagar um centavo. Virando a cabeça, conseguia ver o que
quisesse. Até a pessoa que pagou US$ 600 para ver o jogo "sentado" a
seu lado.
2015 foi um ótimo ano para a RV.
O caminho está aberto para que atinja massa crítica e conquiste público em
2016. A tecnologia evoluiu o suficiente para garantir que o usuário fique
totalmente imerso no conteúdo. Nada de distrações, e-mails ou mensagens nas
redes sociais. A realidade virtual prende sua atenção, altera seus batimentos
cardíacos e mexe com sua emoção.
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