Gabriel
Vilarreal | São Paulo - 26/02/2016 - 14h47
Planejamento, transparência, equilíbrio e
cumprimento de metas não têm sido o forte das leis orçamentárias nos últimos
anos
A primeira vez que tive contato
com a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) foi no início de 2008 ao escrever um
artigo acerca da evolução dos gastos públicos e aumento da carga tributária,
avaliando a qualidade do superavit primário tão falado à época.
A LRF encantou logo na primeira
leitura. Imagine um sistema balanceado de previsão de despesas e receitas, de
limites percentuais de gastos, de mecanismos de compensação de perdas de
receitas ou aumento de despesas. O sistema da LRF é simples e ao mesmo tempo
eficiente, limitando gastos e impedindo o desequilíbrio das contas públicas. Se
respeitada, não tem como dar errado. Se respeitada.
Logo em seu artigo 1º a LRF prevê
que “a responsabilidade na gestão fiscal pressupõe a ação planejada e
transparente, em que se previnem riscos e corrigem desvios capazes de afetar o
equilíbrio das contas públicas, mediante o cumprimento de metas de resultados
entre receitas e despesas”.
- Auxílio-reclusão do INSS: o benefício mais injustiçado da Previdência Social
- A certidão negativa de débitos como condição de participação em campeonatos
- A audiência de ratificação (e outras monstruosidades) no divórcio consensual
- Quais foram as mudanças mais relevantes no Direito do Trabalho em 2015?
Contudo, planejamento,
transparência, equilíbrio e cumprimento de metas não têm sido o forte das leis
orçamentárias nos últimos anos. O Brasil vive um momento de profunda perda de
credibilidade perante o mundo a se refletir nos sucessivos rebaixamentos dados
pelas agências de classificação de risco que culminaram na perda do grau de
investimento.
As previsões do Governo são tidas
como base para decisões por agentes econômicos internacionais. Porém ao longo
dos anos o Governo vem frustrando sucessivamente as próprias previsões. Os
números mudam constantemente. As previsões de crescimento caem ao longo do ano
e a cada dois meses são “reavaliadas”, sempre para menos. A inflação corrói a
moeda nacional e é sempre “reavaliada” para mais. Em 2015, por exemplo, um
superávit previsto na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de R$ 66 bilhões se
tornou um déficit de quase R$ 120 bilhões. Para 2016, a LDO prevê superávit de
R$ 30 bilhões. O que esperar então?
O descontrole das contas públicas
vai além das “pedaladas fiscais” do passado. Este tema, por mais que suscite
calorosos debates, contém texto expresso na LRF: “é proibida a operação de
crédito entre uma instituição financeira estatal e o ente da Federação que a
controle, na qualidade de beneficiário do empréstimo”.
Para 2016, o Governo prevê na
estimativa de receita a inclusão de valores de venda de novos títulos a serem
emitidos para refinanciamento da dívida pública federal, no singelo valor de R$
885 bilhões. Em termos financeiros, o Governo continua pedalando (emitindo
títulos novos para pagar títulos antigos), mas desta vez usando uma
prerrogativa prevista na LRF. Estes R$ 885 bilhões serão pagos com juros, juros
estes a constituir mais despesas a onerar o orçamento nos próximos anos,
recaindo sobre os ombros já cansados do contribuinte.
Mais ainda, a perda de
credibilidade do Governo e a certeza de déficit (contrariamente ao superávit
previsto na LDO) aumenta o grau de risco dos títulos públicos brasileiros,
forçando o Governo a oferecer um prêmio maior ao comprador do título, na forma
de juros mais altos. Ou seja, mais despesa a ser paga às custas da arrecadação
tributária de uma economia estagnada que sacrifica o contribuinte para
alimentar o descontrole do Governo. E como não podia deixar de ser, todo este
cenário gera repercussões ao bolso do brasileiro na forma de aumento de carga
tributária.
Encerramos o ano de 2015 com a
elevação da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) das instituições
financeiras de 15% a 20%. O discurso pregou que se trataria da tributação do
capital financeiro, preservando a população. Na prática, o custo certamente
será repassado na forma de taxas mais altas para o cliente bancário.
Logo em janeiro, a não renovação
da isenção de Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) para remessas ao exterior
ocupou as pautas jornalísticas. Insaciável e em crise de abstinência de
arrecadação, o Governo busca socorro em toda e qualquer receita que exista. E
que não exista também!
O orçamento de 2016 foi aprovado
contendo a previsão de arrecadação da malfadada Contribuição Provisória sobre
Movimentação Financeira (CPMF), independentemente da situação legislativa do
Projeto de Emenda Constitucional (PEC) pelo qual buscam reintroduzir esta
anomalia na vida do brasileiro. A inexistente CPMF dá lastro orçamentário a
despesas do Governo como se efetivamente existisse. Vale lembrar que, mesmo
aprovada, a CPMF deverá aguardar o prazo de 90 dias para poder ser exigida.
Assim sendo, mesmo que aprovada imediatamente, a CMPF perderia praticamente
metade de seu potencial arrecadatório para 2016.
O reequilíbrio das contas
públicas passa obrigatoriamente pelo corte das despesas como mecanismo de
compensação pela perda de arrecadação. Em que pese os constantes anúncios, nada
de substancial ou relevante se materializa. Enquanto isto, o brasileiro paga a
conta na forma de alta da carga tributária e dos juros para fazer frente a
problemas aos quais não deu causa.
Gabriel
Hernan Facal Vilarreal é advogado, sócio do escritório Villarreal, pós-graduado em
Direito Tributário pela PUC de São Paulo e mestre em Direito Político e
Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.