O
Paradoxo de Marte: Por que ainda não entendemos as águas de Marte
Baseado
em artigo de Chelsea Whyte - New Scientist - 22/03/2017
A
simulação à esquerda é como Marte deveria ser no passado para explicar sua
geologia atual. Mas nada indica que ele já tenha sido tão parecido com a
Terra.[Imagem: NASA]
Sinais de água sem água
Alguma coisa não está batendo.
Marte tem calotas de gelo de água
nos polos e há marcas no solo que indicam que a água fluiu em rios e lagos há
bilhões de anos - há poucos dias, a agência espacial europeia apresentou um
estudo detalhado sobre uma megainundação em Marte. De
fato, temos uma compreensão decente de como a água se comporta na Terra, e não
há razão para pensar que as leis da física ou a geologia sejam diferentes em
Marte.
Contudo, mais do que não
encontrar água hoje no planeta, ninguém consegue explicar sequer como a água poderia
ter existido em forma líquida em Marte mesmo no passado.
Este mistério é conhecido como o
"Paradoxo de Marte" - os dados e as teorias mostram que parece ter
havido água lá, mas os dados e as teorias também indicam que nunca houve
condições de ter havido água lá. Se, e quando esse paradoxo for resolvido,
provavelmente será necessário jogar fora um monte de livros didáticos.
Paradoxo de Marte
O atual terreno frio e rochoso de
Marte, seco e coberto de
poeira, apresenta minerais de argila e sedimentos que devem ter sido
depositados por lagos e rios entre 3,5 e 4 bilhões de anos atrás.
O problema começa quando se olha
para as condições em Marte naquele tempo. Ainda hoje, a fina atmosfera do
planeta e a distância do Sol mantêm-no a uma temperatura média por volta dos
-60° C, frio o suficiente para manter água congelada em depósitos polares
permanentes.
Há bilhões de anos, contudo,
quando a água deveria estar fluindo pela superfície, o Sol era mais jovem e
mais frio, o que significa que Marte também era ainda mais frio do que é hoje.
Assim, dado que o ponto de
congelamento da água é o mesmo aqui e lá, como é que Marte pode ter sido algum
dia quente o suficiente para que a água líquida fluísse em sua superfície e
formasse o relevo e as rochas que encontramos lá hoje?
Um dos
planos da NASA para tornar Marte habitável é
dar-lhe um escudo magnético que permita aumentar a densidade da sua atmosfera.
[Imagem: NASA]
Efeito estufa improvável
Uma hipótese plausível seria que
os gases de efeito estufa prenderiam o calor como o fazem na Terra. O problema
é que nenhuma quantidade de CO2 conseguiria aquecer Marte o suficiente para
manter a água líquida. Mesmo com uma atmosfera de CO2 puro sua temperatura só
subiria até perto dos -33° C.
Mas este cenário hipotético é
impensável - Thomas Bristow e seus colegas do Centro de Pesquisas Ames da NASA
acabam de calcular, com base em sedimentos formados há 3,5 bilhões de anos, que
a atmosfera marciana naquela época continha apenas quantidades-traço de dióxido
de carbono.
Então talvez pudéssemos adicionar
um pouco de metano ou hidrogênio - também não dá certo porque, com essa
escassez de CO2, não importa quanto hidrogênio ou metano ou outros gases sejam
adicionados à equação, seria preciso uma atmosfera tremendamente espessa para
blindar esses gases de efeito estufa sensíveis contra a radiação solar.
Bristow e seus colegas
apresentaram agora uma outra alternativa: água salgada o suficiente para
permanecer líquida mesmo a temperaturas muito abaixo de 0º C. Nesse caso, a
atmosfera não precisaria de muito CO2.
Também não parece plausível ou
suficiente. Uma água ultrassalina pode até fluir - na Terra, pelo menos - mas o
frio do planeta não permitiria chuvas suficientes para explicar a água parada
gravada no arenito e no xisto de Marte ao longo de milhões de anos.
Mistérios da água
Então, será que existe algum
mecanismo planetário que ainda não entendemos? Uma mistura de gases de efeito
estufa que ainda não identificamos?
Talvez o verdadeiro problema seja
a nossa compreensão da própria água. Nós já sabemos que a água tem mais de 70 "anomalias",
muitas delas incomodando algumas das nossas bem-amadas leis da física - como
quando a água mais fria flui para o topo de um copo, por exemplo.
Seja qual for a resposta, estamos
ficando sem soluções óbvias para o Paradoxo de Marte. Quando ele for resolvido,
talvez nos vejamos em territórios ainda mais estranhos e desafiadores do que o
solo do planeta vizinho.
Bibliografia:
Low Hesperian PCO2 constrained from in situ mineralogical analysis at Gale Crater, Mars
Thomas F. Bristow, Robert M. Haberle, David F. Blake, David J. Des Marais, Jennifer L. Eigenbrode, Alberto G. Fairén, John P. Grotzinger, Kathryn M. Stack, Michael A. Mischna, Elizabeth B. Rampe, Kirsten L. Siebach, Brad Sutter, David T. Vaniman, Ashwin R. Vasavada
Proceedings of the National Academy of Sciences
Vol.: 114 no. 9 - 2166-2170
DOI: 10.1073/pnas.1616649114
Low Hesperian PCO2 constrained from in situ mineralogical analysis at Gale Crater, Mars
Thomas F. Bristow, Robert M. Haberle, David F. Blake, David J. Des Marais, Jennifer L. Eigenbrode, Alberto G. Fairén, John P. Grotzinger, Kathryn M. Stack, Michael A. Mischna, Elizabeth B. Rampe, Kirsten L. Siebach, Brad Sutter, David T. Vaniman, Ashwin R. Vasavada
Proceedings of the National Academy of Sciences
Vol.: 114 no. 9 - 2166-2170
DOI: 10.1073/pnas.1616649114
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